Resumo de "A Intervenção das Massas: a psicologia entre o controle e a resistência"
BARROS, Regina D. B. De; JOSEPHSON, Silvia C. A Intervenção das Massas: a psicologia entre o controle e a resistência. In: JACÓ-VILELA, Ana M.; FERREIRA, Arthur A. L.; PORTUGAL, Francisco T. História da Psicologia: rumos e percursos. Rio de Janeiro: Nau Ed., 2007.
A junção de forças que investem no desaparecimento das diferenças sociais influenciou a emergência do Estado moderno, onde todos os indivíduos devem ser vistos como iguais e com as mesmas possibilidades de desenvolver-se, em igualdade. Essa igualdade de direitos é uma exigência de se expressar individualmente, seus desejos e anseios.
O indivíduo é resultante da oposição e união do exercício de um poder que se executa, como estímulo a uma maneira de vida que individualiza o que diz respeito à experiência subjetiva da atualidade, fundada nas condições de constituição de um ‘modo-padrão’ de viver as relações. Os valores individuais complementam-se com a espontaneidade e a diversidade dos indivíduos, fortalecendo a noção, cada vez mais dominante, da individualidade da experiência humana.
A sociedade, compreendida como a totalidade dos indivíduos, constituiria um conjunto que deveria funcionar para tornar viáveis os interesses individuais. Esta forma de funcionamento é associável ao que está presente no sistema fabril, ligado ao capitalismo, que está instaurado na divisão do trabalho, cujo o fundamento era que a produção não parasse e, para isso, era indispensável que cada trabalhador fizesse sua parte, assim, o produto estaria pronto, acabado.
Na pretenção de dar uma explicação para o movimento de massas, as teorias da hipnose, da sugestão, do contágio, foram então, muito empregadas na Europa com as grandes revoluções. Também, foram criadas certas disciplinas para dar conta da aglomeração das cidades europeias, tais como a medicina social, o higienismo, a sociologia e a estatística, que tinham os centros urbanos como objeto de pensamento, intervenção e controle.
Tarde (1893), em “As Multidões e as Seitas Criminosas”, estabelece diferenças entre as formas de agrupamentos sociais: os transeuntes de uma rua ou os camponeses em uma feira, por exemplo, estariam agrupados fisicamente, mas não socialmente. As pessoas, devido às suas semelhanças de origem social têm a potência para associar-se, conforme a situação, ocorrendo então, um agrupamento social. A partir daí, segundo ele, nasce a multidão, que poderá até se construir em uma corporação, se caso manter organizado.
De acordo com Tarde (1893), não apenas os poderes judiciário e policial deveriam se encarregar do controle dos indivíduos, mas também teria que ser criada uma rede de vigilância e correção, encarnada nas instituições psicológicas, psiquiátricas, pedagógicas e médicas. Para Tarde, quando uma opinião se propaga, ela produz um efeito de similitude de pensamento, o que faz com que a opinião deixe de ser uma realidade individual e se torne um fato coletivo.
O Século XIX esteve marcado pelos movimentos de massa e isso significou uma mudança na correlação de forças até então. Nesta perspectiva, pode-se observar que se mantém dominante o mesmo modo de subjetivação já instaurado. Isto é, o modo de subjetivação individual. Assim, as massas são tomadas como um conjunto de indivíduos que apresentam certas características semelhantes entre si, quando reunidos.
Para Le Bon (1954), em “Psicologia da Multidão”, quando o indivíduo está imerso na multidão, ele perde o seu autocontrole, atua de modo impulsivo, irracional e, até mesmo, de modo 'bestial'. Contanto, forma-se uma mente coletiva que se apossa de cada indivíduo, produzindo a incapacidade para raciocinar, deixando-o ausente do espírito crítico e do discernimento, criando o sentimento de poder absoluto e a perda da noção de responsabilidade.
A Psicologia Social, estaria, segundo Freud, em seus passos iniciais e teria um grande número de problemas para resolver, entre eles, seria explicar o fato surpreendente de que, sob determinadas condições, tal como estar em meio à uma multidão, os homens se comportam de forma totalmente diferente da sua forma usual e rotineira. Freud argumenta que, se os indivíduos na massa encontram fundidos em uma unidade, deve haver alguma coisa que os une, e essa coisa seria precisamente aquilo que caracteriza as massas.
Freud explica o funcionamento das multidões como aquilo que liga seus componentes entre si e faz com que elas sejam exatamente multidões: cada indivíduo projeta sobre os outros e sobre o líder a idealização do que cada ego individual estruturou para si mesmo.
Já Reich (1897-1957) diz que é preciso liberar a energia libidinal e, por isso, concentra seus estudos sobre família autoritária e patriarcal, considerada como o lugar primário de repressão e do conservadorismo, como também de 'correia' de transmissão entre a estrutura econômica burguesa e sua superestrutura ideológica.
Reich buscou articular a libido, o desejo individual, com a política, procurando demonstrar que os instintos humanos são formas aptas a receberem conteúdos sociais e se estruturam principalmente pelas relações com os pais e professores, adquirindo um carácter definitivo.
Enquanto isso, Canetti (1983), em “Massa e Poder”, fala que o homem se insere na massa para escapar do medo do desconhecido ou diferente. Neste sentido, as massas só existem a partir da ‘descarga’, – o memento, o qual os indivíduos se desfazem de suas diferenças. Canetti cita quatro caracteres da massa: ela sempre quer crescer; em seu interior reina a igualdade; ela adora a densidade; ela necessita de uma direção.
Para Deleuze (1925-1995) e Guattari (1930-1992), com base no texto “1933 – Micropolítica e Segmentaridade”, tanto a sociedade quanto o indivíduo são atravessados ao mesmo tempo por duas ordens de organização do socius: uma molar e outra molecular, onde a noção de simultaneidade ou coexistência apontaria que tudo é macro e micropolítica ao mesmo tempo.
Com base neste pensamento, uma organização molar onde haveria predominância das formas já instituídas e superestabilizadas, existiria ao mesmo tempo segmentações ‘finas’ e afetos inconscientes que operam em nível molecular. Por exemplo, as classes sociais e/ou dos sexos, o que pode-se notar é que, além das divisões visíveis de inclusão, introduzem-se agenciamentos moleculares, invisíveis.
Assim, segundo esses autores, Marx e Engels, descreveram a organização e a exploração das classes, – o que estaria associado ao segmento do tipo molar. No livro “O Capital”, Marx teoriza que o capitalismo só pode sustentar produzindo de maneira contínua a essência subjetiva da ‘riqueza abstrata’, onde a produção, por um vértice, torna-se um fim nela mesma e, por outro vértice, opera como um objetivo limitável – como produção para o capital.
(Resumo elaborado em 2012, UNOCHAPECÓ, São Lourenço do Oeste).