Resenha de "Sentidos sobre a Prática Grupal no Contexto da Saúde Pública"
RASERA, Emerson F; & ROCHA, Rita M. G. Sentidos Sobre a Prática Grupal no Contexto da Saúde Pública. In: Revista “Psicologia em Estudo”. Maringá: v. 15, n. 1, 2010. p. 35-44.
Objetivo
Teve por objetivo descrever os sentidos das práticas grupais identificados em entrevista com psicólogos que atuam no âmbito da saúde pública da cidade de Uberlândia – Minas Gerais.
Fundamentação Teórica
A análise está baseada na perspectiva do construcionismo social, o qual permitiu identificar repertórios interpretativos: grupo como espaço coletivo, como alternativa para a demanda, como proposta mediadora e como estranhamento.
Metodologia
A utilização de repertórios na entrevista de pesquisa de dados.
Resultados Esperados
Os mesmos têm possibilitado legitimar a prática grupal de diversos modos, no entanto, a predominância de um viés clínico-individualista na fala dos entrevistados sobre as práticas grupais dificultou uma descrição voltada às equipes e comunidades e sensível ao nível de atenção em saúde.
Considerações Finais
Nesta perspectiva, prevalece à necessidade de novas construções sobre o dizer e/ou o fazer das práticas grupais na saúde brasileira.
Resenha do Texto
Na atualidade, a atuação do psicólogo requer uma abrangência maior e em contextos mais amplos, dentro de um compromisso com a sociedade por uma ciência a serviço de seus interesses. Estudos realizados, desde a década de 80 (Benevides, 2005; Dimenstein, 2000; Silva, 1992; Spink, Bernardes & Menegon, 2006), demonstram as dificuldades de inserção encontradas no âmbito da saúde pública, principalmente em relação ao seu despreparo profissional, falta de discussões e estágios a respeito da graduação e a preponderância da prática clínica e descontextualizada.
A atuação do psicólogo no âmbito da saúde pública, em um estudo recente realizado em uma cidade de Minas Gerais (Goya & Rasera, 2007), também aponta a escassez de formação dos profissionais no âmbito do serviço público, com um discurso simplificado e estereotipado sobre saúde, apresentando desconhecimento dos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), ausente de atividades relativas à promoção da saúde e prevenção e também uma dicotomia entre saúde e saúde mental, dificultando o trabalho em equipe multiprofissional.
Neste sentido, foi possível torna-la concreta uma tentativa de produzir uma nova forma de atuação na saúde pública de acordo com as necessidades da população daquela região, através da utilização das práticas grupais. As práticas grupais estão em sincronia com a proposta do SUS, de acordo com seus princípios de universalidade do acesso, integridade da atenção e controle social, possibilitando contribuir com a democratização do acesso a saúde no Brasil e permitindo a participação da sociedade em atenção integral conforme suas necessidades.
Outras maneiras de atuação em práticas grupais também vêm crescendo, tais como a Psicologia Social Comunitária, a qual aborda a relevância da atuação psicossocial e as relações de poder do dia-a-dia, onde o grupo atua de modo propício para que essas relações sejam percebidas por seus membros. Em estudos de Molena (1999) sobre as práticas grupais no âmbito da saúde pública, os profissionais entrevistados demonstraram carência de familiaridade com as técnicas grupais e o papel do coordenador e também dificuldades em se vincular em contextos antes não ocupados e não promovendo discussões acerca.
Souza (1999) também reconhece a utilização das práticas grupais como maneira de intervenção em instituições públicas, porém, entende que estas vêm aliadas ao descaso a respeito da forma com que o trabalho é realizado e ao estranhamento do profissional quanto a seu papel de coordenador. Lancetti (1993) descreve os problemas que envolvem os grupos com tarefas manuais, com relação às oficinas, onde devem considerar a atuação além do ‘fazer uma tarefa’ e da reintegração social, enfatizando os desdobramentos ocasionados na prática dessa tarefa e a produção subjetiva consequente.
No entanto, ainda existe a dificuldade de implantação do atendimento grupal no âmbito da saúde pública, conforme suas precisões. De acordo com alguns dados de levantamento (Spink, Bernardes & Menegon, 2006) com 346 psicólogos do Brasil, 10,4% dos mesmos entrevistados alegam realizar atendimento em grupo e 3,3% em oficinas. Os percentuais citados são inferiores quando comparados ao do atendimento individual que chegam a 42,1%. Dentre os questionamentos está um referente uma ‘cultura psicológica’, universalmente atribuidora, a qualquer grupo e/ou contexto, de uma linguagem intimista ou interrogativa, estabelecida como tarefa do psicólogo como trabalhador na saúde mental.
Generalizando, foi possível, por meio dos repertórios identificados, legitimar as práticas grupais de diversas formas, pois ela tem tanto a potencialidade de produzir coletivamente efeitos benéficos aos participantes quanto responder às necessidades de atendimento do serviço, como ainda se constituir como um complemento do tratamento. Em contraposição, o viés clínico-individual utilizado por maior parte dos profissionais psicólogos e sustentado por discursos da psicoterapia individual, se faz presente na constituição de grande parte dos repertórios da pesquisa.
Não obstante, os repertórios na entrevista de pesquisa não levam em consideração no seu sentido prático o uso de técnicas e práticas que estejam baseadas na coletividade, nas organizações, equipes, comunidades, em terapia de grupo. De acordo com esses repertórios, foi possível observar que maior parte dos profissionais de psicologia não tem foco no fazer profissional em terapia de práticas grupais, como uma das maneiras de intervenção voltadas ao cuidado do sujeito. Também possibilitou observar que os discursos dos profissionais não havia diferenciação alguma em relação às conformidades contextuais em que estão inseridos, institucionalmente.
Com isso, exprime uma conotação da descrição do grupo como sendo uma práxis de sentido genérico, com base em um método abstrato. Isso demonstra que as falas dos profissionais eram compartilhadas de acordo com objetivos específicos nos repertórios, isentos de estar determinados e/ou inseridos a partir do tipo do trabalho profissional que se realiza dentro da instituição onde o psicólogo atua. Assim, torna-se necessário analisar e repensar o quão é importante, não somente a formação profissional (como citado pelos autores), mas também e principalmente a qualificação dessa formação que se desenvolve durante a graduação de psicologia.
Contudo, em conformidade com as ideias dos autores citados, deve-se haver uma maior sensibilização em relação ao contexto da utilização de intervenções em práticas grupais, buscando se mobilizar por uma análise crítica e problematizadora, facilitando e ampliando à maneira que nos permite a construção das práticas em si mesmas, criando em sentido coletivo espaços para articular, produzir e intervir por meio de novas formas de pensar e agir frente ao fazer científico das práticas grupais e seu desenvolvimento no cenário brasileiro da saúde mental.
(Resenha elaborada em 2012, UNOCHAPECÓ, São Lourenço do Oeste).